Saturday, January 21, 2012

Brado Retumbante e o início da disputa pela sucessão de Dilma


Não assisti nenhum capítulo da minissérie global O Brado Retumbante que estreou na terça-feira (17 de janeiro). Nos últimos dias, contudo, recebi muitas mensagens solicitando meu comentário sobre esta produção global. Nas mensagens que recebi, a grande maioria sugere que a Globo teria se inspirado na figura de Aécio Neves para montar o perfil do político anti-político que protagoniza o enredo. Li uma crítica sobre a minissérie (postado no Cenário MT, de onde retirei a foto abaixo) relembrando que a 
TV brasileira já apresentou várias críticas ao Governo e governantes de nosso país, recheadas de metáforas com a realidade – O Salvador da Pátria, Que Rei Sou Eu?, Vale Tudo, O Bem Amado, Roque Santeiro, O Rei do Gado. Mas nunca se escancarou tanto uma realidade disfarçada de ficção como na trama de O Brado Retumbante, com personagens tão parecidos com os da vida real, em aparência ou atitudes – como os políticos e jornalistas que cercam o presidente protagonista.
Portanto, não são apenas internautas que tiveram a impressão nítida da Globo ter ingressado na disputa eleitoral de 2014. Tenhamos claro que o texto (de Euclydes Marinho)  contou com a colaboração de Nelson Motta, declarado opositor ao lulismo.  

Domingos Montagner vive o deputado Paulo Ventura, que consegue se eleger  Presidente da República num golpe de sorte. O perfil deste deputado-Presidente é citado por muitos internautas que enviaram mensagens como similar ao de Aécio Neves: ex-Presidente da Câmara Federal, mineiro, jovem, mulherengo, que vive no Rio de Janeiro. 

Mas a minissérie não pegou. O Brado Retumbante ficou poucos pontos acima do segundo lugar no seu primeiro capítulo (A Hora do Rush 2, apresentado pelo SBT). E é neste ponto que vale a pena analisar esta possível tentativa de antecipar a eleição de 2014 ou criar uma referência. 
Se a estratégia realmente existiu, revela uma importante alteração nos expedientes já utilizados pela Globo para tentar influenciar a disputa eleitoral presidencial. Não apenas mais sutil, embora mais direta, mas procurando expor uma alternativa política ao bloco governante. Muito superior à desconstrução da realidade como ocorreu no caso Proconsult (prejudicando Leonel Brizola) ou na edição do debate entre Lula e Collor.
Mesmo assim, a Globo revela estar um passo atrás da conjuntura política. Não foi surpresa a minissérie não emplacar no IBOPE (um exemplo foi o índice em queda no dia 19, em que a minissérie iniciou com 17,6 pontos às 23h13 e caiu a cada cinco minutos até atingir 14 pontos). 
O problema é que a Globo desconsiderou o ideário da Classe C, que define IBOPE e disputa política há duas eleições nacionais. 
A Classe C não é afeta ao discurso anti-corrupção. Seu foco é outro: o consumo e a estabilidade. Aliás, as diversas pesquisas realizadas para compreender como esta classe emergente pensa indicam que a maioria de seus componentes não acredita em político algum. É absolutamente pragmática em relação a este tema. Vota em quem lhe garante estabilidade e consumo ascendente. 
A minissérie da Globo, se realmente teve a intenção de ingressar na disputa de 2014, desconsiderou, ainda, os motivos que levam à desidratação acelerada dos partidos e lideranças de oposição ao lulismo. A ausência de discurso para o país, a dificuldade em se espraiar pelo nordeste e a limitação gradual dos partidos efetivamente oposicionista (como a formação do PSD e as negociação em curso para fusão do DEM com PMDB), reduzem o campo da crítica moralista. 
Vivemos um momento político muito distinto daquele em que Lula e Collor, dois outsiders, disputaram o governo federal. Naquele momento, a grande maioria dos eleitores desejava mudança radical e colocaram na berlinda lideranças institucionais importantes, como Brizola, Covas, Maluf, Ulysses Guimarães, Guilherme Afif Domingos, Roberto Freire e Aureliano Chaves. 
Mas o momento não inspira qualquer sentimento de mudança que envolva os emergentes da classe média baixa (53% dos eleitores). O que ganhariam estes eleitores trocando o certo (a ascensão social dos últimos seis anos) pelo incerto (um novo bloco de governo)? Trata-se de uma equação pragmática e não adesão ao lulismo. 
O que remete à situação que quebraria a segurança do voto na situação: inflação em alta, retração na oferta de crédito, diminuição no ritmo do aumento real do salário mínimo, queda no crescimento do PIB, enfim, causas para referar o consumismo em alta das classes emergentes. 
Enfim, a Globo escolheu um roteiro que deu um passo à frente em relação ao seu expediente de comunicação política (seu editorial), mas ainda não conseguiu captar o Brasil real. Está um passo atrás da conjuntura. O que, talvez, explique a queda de audiência de tantos programas tradicionais.

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